Início dos anos 1960 e ainda adolescente, fui estudar no colégio Diocesano Santo Antônio. Tenho duas memórias desse tempo: uma bastante positiva diz respeito à arquitetura. Não sei o ano construção do colégio já que as pessoas usam, mas não reparam. Detalhes importantes como estilo, projeto, intenções, etc. isso ninguém trata de contar.

É como as instalações, por exemplo, do belíssimo prédio do Bom Conselho, administrado pelas freiras, representando o lado feminino do ensino católico na cidade; hoje é a sede da prefeitura e a impressão que se tem é que o prédio já se descaracterizou nas mãos dessa espécie de gente que tem coragem de se envolver com o mundo sub da política.

Ao que parece, poucos amam nosso patrimônio arquitetônico. Vejam a situação da Vila Santo Aleixo e do magnífico prédio da Casa da Lavoura. Estão lá, à deriva e expostos à sanha inculta dos especuladores.

Um dos maiores crimes culturais praticados contra nossa história foi a demolição da casa dos Campelo na Praça Santa Terezinha para a construção de uma farmácia. Ninguém pensou que ali viveram Tony e Celly, figuras fundamentais na história musical do povo brasileiro.

A Capela do Diocesano é linda, digna e serena. Inesquecível para quem, mesmo sem gostar, assistia missas e fazia ali as orações diárias que davam início às atividades. O lado negativo da minha relação com o Diocesano se dava no aspecto conceitual. Queriam que eu fosse um católico do jeito que eles achavam que deveria ser um verdadeiro praticante. Não me lembro de ter encontrado nessa vida situação tão humilhante como aquela onde os padres obrigavam os alunos a assistir missa nos domingo e depois obrigados a levar a carteira de freqüência para o

celebrante assinar. Burrice, ignorância, prepotência, falta de sensibilidade, etc. Eu odiava essa obrigação. Então, só me restava mentir. Ficava ali na praça e depois levava a carteira para o padre assinar.

Foi assim que um dia na sacristia da catedral e em defesa dos meus direitos de fazer o que me fosse mais conveniente, eu disse para o padre Evaristo que havia assistido a missa das dez quando essa nem havia começado. Fui expulso do templo aos gritos de “Demônio”, “Satanás”, “Pecador Maldito”, etc. Ainda um menino, saí de lá me sentindo o mais ínfimo dos seres humanos.

Não havia como deixar barato essa humilhação suprema pela qual passei. Teria que haver um jeito de mostrar que eu estava muito longe de ser qualquer uma dessas coisas de que fui acusado porque pelo meu coração nunca passou maldade alguma. Eu até hoje ainda continuo um puro, graças a Deus.

Então, compus uma canção. Sempre foi assim. Taubateanamente eu me vingo do padre com uma canção sutil. Gosto tanto dessa música que passei a ter até certa simpatia pelo padre que, com certeza, devia estar estressado naquela manhã de domingo. Quem sabe tivesse levado uma bronca do bispo, ou qualquer coisa assim. Acabei por perdoá-lo como um bom cristão.

 

A IGREJA MATRIZ

DO PADRE EVARISTO

QUE BRANCA

AO LONGE

NA PRAÇA EU AVISTO

COM AS TORRES SONORAS

MOLDURAS DA LUA

VIVEU SUA VIDA

PROS HOMENS DA RUA

AOS FARTOS DA VIDA

ESQUECIDOS DA FÉ

QUE ALEGRAM FALANTES

O VIZINHO CAFÉ

É COISA MAIS SÉRIA

…É SÓ O QUE É!

E AOS POBRES QUE HABITAM

COM CERTA ARROGÂNCIA

AS PORTAS DO TEMPLO

SEM DAR IMPORTÂNCIA

É QUENTE POR FORA

…POR DENTRO É DISTÂNCIA!

PRAS VELHAS SENHORAS

EM TRAJES DISCRETOS

QUE VÃO LÁ SERIAMENTE

BUSCAR SEUS AFETOS

É TODA INFINITO

…E ACABA NO TETO!

 

Texto Publicado Originalmente em julho de 2012 no Jornal Contato.

 

O músico e compositor Renato Teixeira de Oliveira nasceu em Santos. Passou a infância em Ubatuba e veio morar em Taubaté na adolescência.