Autor de “Os Sertões” viu pela primeira vez seu livro impresso aqui

1902. Euclides da Cunha estava no restaurante da estação de… Taubaté! Quando, no meio da multidão que saltava do trem, vê um homem com um livro em baixo do braço. O escritor estremece! Parecia ter avistado um exemplar de “Os Sertões”. Ele, o próprio autor, ainda não tinha visto o livro impresso.Tremendo de emoção, Euclides aborda o sujeito:

“O senhor me deixa ver esse livro?”

Medindo Euclides de cima a baixo, o desconfiado homem estende o livro sem largá-lo.

Era mesmo Os Sertões.

– Obrigado.

O seu desejo foi atirar-se ao sujeito e abraça-ló. Mas voltou para a sua mesa. O livro estaria fazendo sucesso? Teria sido bem sucedido? Os jornais o que estariam dizendo? E a figura do passageiro de guarda-pó surgia-lhe à imaginação. Aquele sujeito não tinha cara de gostar de ler. Se estava lendo seu livro é porque estava gostando. E estaria mesmo? Quem sabia se aquilo não era apenas ostentação, vaidade de mostrar-se aos outros passageiros do trem como leitor de um livro grosso! Podia ser! Mas como foi que ele comprou o livro? O volume custava 10 mil réias. Só se dão 10 mil réis por um livro, quando se sabe, ou se ouve dizer, que esse livro é bom. Se aquele homem comprou, é porque ouviu dizer, ou por um amigo ou pelos jornais. Mas podia ser que aquilo fosse um presente. Podia. E o sujeito estaria gostando? Se ele não estivesse, ao saltar do trem para tomar um refresco na estação, deixaria o volume no seu banco. Se o trouxe debaixo do braço era porque o livro lhe era precioso. Mas também podia ser que fizesse aquilo para que lhe não o roubassem. Mas um livro mau, ninguém se importa que carreguem com ele. E nesse torturar de espírito, Euclides chegou a Lorena. Esperavam-lhe jornais e cartas. Cartas do editor. Do editor havia duas. Abriu uma ao acaso, por felicidade. Por felicidade era a segunda! Nessa carta, o editor dizia que estava assombrado com a venda do livro e que em oito dias estava quase esgotado um milheiro; contava-lhe do sucesso, das críticas dos jornais, do barulho que a obra estava fazendo.

A outra carta, a primeira, era esmagadora. O editor confessava-se-lhe redondamente arrependido de tê-lo editado, dizia que não havia vendido um único volume e mais: que sendo cada volume um único volume pelo preço de 10 mil réis, mandará oferecer aos sebos da rua de S. José, por cinco e nem um só aceitara.

– Se eu tivesse lido essa carta primeiro lugar, parece que morreria, conclui Euclides, sorrindo.

É essa a história ingênua da obra máxima da nossa literatura.

De Euclides para Viriato Correia em 1909.

 

Fonte: Revista Ilustração Brasileira, janeiro de 1943

 

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